A intuição
"A Filosofia distingue duas grandes modalidades da atividade racional realizadas pela razão subjetiva ou pelo sujeito do conhecimento: a intuição e o raciocínio. A atividade racional discursiva, como a própria palavra indica, percorre uma realidade ou um objeto para chegar a conhece-lo, isto é, realiza vários atos de conhecimento até conseguir captá-lo. A razão discursiva ou o pensamento discursivo chega ao objeto passando por etapas sucessivas de conhecimento, realizando esforços sucessivos de aproximação para chegar ao conceito ou a definição do objeto. A razão intuitiva ou intuição, ao contrário, consiste em um único ato do espírito, que, de uma só vez, capta por inteiro e completamente o objeto. A palavra intuição deriva de um verbo latino, intuere, que significa "olhar atentamente, contemplar e ver claramente". A intuição é uma visão direta e imediata do objeto do conhecimento, um contato direto e imediato com ele, sem necessidade de provas ou demonstrações para saber o que conhece. A intuição é uma compreenção global e completa de uma verdade, de um objeto, de um fato. Nela, de uma só vez, a razão capta todas as relações que constituem a realidade e a verdade da coisa intuída. É um ato intelectual de discernimento e compreensão. A intuição sensível ou empírica é psicológica, istó é, refere-se aos estados do sujeito do conhecimento como ser corporal e psíquico individual - sensações, lembranças, imagens, sentimentos, desejos e percepções são exclusivamente pessoais, variando de pessoa para pessoa e numa mesma pessoa em decorrência de variações em seu corpo, em sua mente ou nas circunstâncias em que o conhecimento ocorre. A intuição intelectual é o conhecimento direto e imediato dos princípios da razão (identidade, contradição, terceiro excluído, razão suficiente), os quais, por serem princípios, não podem ser demonstrados (pois, para demontrá-los, precisaríamos de outros princípios, e para demontrar esses outros princípios precisariamos de outros, num processo interminável que nos impediria de saber com certeza a verdade de um princípio). Alguns filósofos afirmam também que conhecemos por intuição as idéias simples, isto é, aquelas que não são compostas de outras e não precisam de outras para serem conhecidas. Justamente porque não dependem de outros conhecimentos ou de outras idéias, as idéias simples são apreendidas num ato intuitivo. No entanto, como a intuição pode ser o ponto final de um processo de conhecimento, ela é também a apreensão intelectual das relações necessárias entre as idéias e os seres e entre as idéias e as coisas de que são as idéias."
Convite à Filosofia
Marilena Chaui
éditora ática
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